terça-feira, 29 de julho de 2014

Nomes bíblicos do povo de Deus (ii)

Discípulos

“Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações” (Mt 28:19).


Este é, sem dúvida, o nome mais conhecido pelo povo de Deus no Novo Testamento. Para muitos é desnecessário escrever sobre este assunto. Todos sabemos que um discípulo é um que segue e aprende do Mestre. Contudo, quando estudamos o uso desta palavra nos ensinos de Cristo, talvez há ainda algo mais que podemos perceber neste nome. O importante é entender o significado do nome na maneira que o Senhor Jesus o usava.

Em primeiro lugar, poder ser uma surpresa para alguém aprender que nem todos os discípulos de Cristo são filhos de Deus. Em Jo 6:60-71 vemos provas desta verdade: “Muitos dos Seus discípulos, tendo ouvido tais palavras, disseram: Duro é este discurso, quem o pode ouvir? … À vista disto, muitos dos Seus discípulos O abandonaram, e já não andavam com Ele” (vs. 60 e 66). Um discípulo, no sentido verdadeiro, é alguém que não somente segue Cristo, mas que O segue para receber e praticar a Sua Palavra. Naquele tempo, como hoje, muitos eram “discípulos” não por causa da Palavra de Cristo, mas por causa das bênçãos materiais, como na multiplicação dos pães e nas curas que o Senhor Jesus realizava. Quando Cristo aplicou Seus sinais espiritualmente, e os ensinou que daria a Sua vida e o Seu sangue na cruz, e que era necessário eles confiarem neste sacrifício pela fé, recebendo-O como o Pão do céu, não quiseram mais ouvir tal discurso. Hoje há muitos “discípulos” deste tipo, que somente tem interesse nos sinais e bênçãos materiais, mas não querem nada da mensagem de arrependimento do pecado e da fé em Cristo.

Veja também o caso do cego de nascença (Jo 9:24-34). Aquele homem demonstrava ser “discípulo” de Cristo quando foi curado (v. 27), mas foi só depois disto que ele conheceu Cristo como seu Senhor e Salvador pessoal e se tornou um verdadeiro discípulo do Mestre (v. 35-38).

Foi naquele mesmo tempo, quando apareciam muitos “discípulos” superficiais, que o Senhor Jesus explicou o que é o “verdadeiro discípulo”: “Se vós permanecerdes na Minha Palavra, sois verdadeiramente Meus discípulos” (Jo 8:31). Certamente podemos discernir nesta afirmação uma preocupação por parte do Senhor, que conhecia o coração de cada um, com muitos daqueles judeus que “haviam crido nEle”. O fato é que há muitas maneiras de “crer” em Cristo, e parece que aqueles “creram” de uma forma superficial, por causa das bênçãos materiais e sinais, mas sem arrependimento do seu pecado. Veja também Jo 2:23-25, e note bem como a natureza humana é enganosa. Estes fatos devem nos ensinar a ter cuidado com os nomes “crente” e “discípulo”, que são tão populares em nossos dias.

Em Lucas 9:57-62 vemos a prova de três dos seguidores de Cristo. Embora a palavra “discípulo” não seja usada neste trecho, o uso da palavra “seguir” em cada caso (vs. 57, 59 e 61) indica que os três eram discípulos professos de Cristo naquele tempo. Contudo, não passaram pela prova de Cristo. O primeiro “discípulo” queria condições de conforto, mas aprendeu de Cristo que nem Ele gozava os confortos dos animais e das aves. Ouvindo isto, o homem não quis mais seguir ao Senhor para “onde quer que for”. O segundo foi convidado a ser discípulo do Senhor, mas achava difícil se separar do pai velho que jazia perto da morte. O Senhor lhe mostrou que havia outros para cumprir esta necessidade humana, mas que haviam poucos verdadeiros discípulos para O seguir e fazer o trabalho espiritual de pregar o Evangelho. Parece que aquele “discípulo” também achava duro o “discurso”, e nada mais lemos dele. O terceiro também queria ser discípulo, mas achava necessário primeiro se despedir da sua família. O Senhor conheceu seu coração e viu que ele não estava disposto a deixar tudo pelo reino de Deus. Nenhum dos três era discípulo na maneira que Cristo julgava necessário. Isto deve nos fazer pensar se a nossa compreensão deste nome “discípulo” até agora realmente tem sido como Cristo pensa.

Chegamos agora a Lucas 14:25-33, que será nosso último trecho nesta consideração. Neste trecho vemos claramente o que nosso Senhor Jesus Cristo espera dos Seus discípulos. Era ainda aquele tempo quando muitos seguiam Cristo, e lemos: grandes multidões O acompanhavam”. A palavra “acompanhavam” indica um relacionamento muito flexível, e sem qualquer compromisso. O Senhor, conhecendo seu modo de pensar, lhes deu ensino que até hoje não é fácil receber. Ele tocou primeiro na família do discípulo (v. 26) e mostrou que o verdadeiro discípulo ama Cristo mais que pai, mãe, mulher, filhos, irmãos e irmãs. Ele acrescentou: “e ainda a sua própria vida”. Vemos que o padrão é muito alto, e muitos “discípulos” são desqualificados porque, como Eli (I Sam. 2:29), honram mais sua família do que o Senhor. A nossa “própria vida” quer dizer as nossas ambições e possessões pessoais nesta vida. Tudo tem que ser colocado na mão do nosso Senhor, se quisermos ser Seus discípulos.

E isto não foi tudo. O Senhor continuou Seu ensino sobre a necessidade do discípulo também “tomar a sua cruz” (v. 27)! A cruz é símbolo de sofrimento e morte. Tomar a cruz não é sofrer obrigatoriamente, como pela doença que ataca qualquer um, mas sim, voluntariamente, por escolha própria, como Moisés escolheu sofrer com o povo de Deus no deserto, e recusou o conforto do Egito. Ele “considerou o opróbrio de Cristo por maiores riquezas do que os tesouros do Egito, porque contemplava o galardão” (Hb 11:26). Sim, Moisés era um verdadeiro discípulo de Cristo!

Evidentemente, este assunto é mais profundo do que muitos tem pensado. Precisamos nos “assentar para calcular a despesa” (Lc 14:28) antes de dizer que somos discípulos de Cristo. Mas é este tipo de discípulo que Cristo quer hoje. Suas últimas palavras na terra: “Ide, fazei discípulos de todas as nações”, não deixam qualquer dúvida de que é a Sua vontade que nós, em primeiro lugar, sejamos este tipo de discípulo e, em segundo lugar, que façamos outros discípulos deste mesmo tipo. Que tipo de discípulo somos? Estamos fazendo estes discípulos?

Como Moisés bem sabia, há recompensa futura para os verdadeiros discípulos de Cristo. Alguém pensando que “duro é este discurso” pode ter consolação no fato que o Senhor acrescentou: “E eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos” (Mt 28:20). O Senhor vai com Seus discípulos cada dia, e a Sua presença é recompensa mais do que suficiente para qualquer dificuldade ou sacrifício que temos de enfrentar, como os dois na estrada para Emaús descobriram (Lc 24:32). Também é grande consolação lembrar o que o Senhor Jesus falou para Seus primeiros doze discípulos sobre o dia de sofrimento na vida dum discípulo verdadeiro. Ele disse: “Regozijai-vos naquele dia, e exultai, porque grande é o vosso galardão no céu” (Lc 6:20, 22, 23).

Que sejamos não apenas “filhos de Deus”, mas também “verdadeiros discípulos” de Cristo. Que possamos também procurar fazer outros verdadeiros discípulos, para a glória e honra do nosso Senhor Jesus Cristo, até que Ele venha.

S. Davidson (continuará)

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